Por Ronnie W. Rogers

Eu concordo com a afirmação calvinista de que o evangelho é simples e claro, mas afirmo que o calvinismo, por sua própria natureza, complica e obscurece o evangelho simples e claro.1 Sim, é possível que alguém seja salvo quando alguém diz mais ou menos: “Creia no Senhor Jesus Cristo”, mas a diferença entre o que um calvinista e um extensivista (não-calvinista) querem dizer quando usam essas palavras é bem diferente.2 O conjunto de conceitos extrabíblicos necessários para caracterizar o calvinismo como uma posição bíblica é revelador.

A visão deles requer conceitos como duas vontades (revelada e secreta), dois chamados (externo a todos e interno apenas aos eleitos), dois amores (salvificamente falando, em vez de tipos diferentes, tais como o amor de um filho ou cônjuge), dois níveis de expiação (suficiente para os não-eleitos, mas eficiente apenas para os eleitos), duas linhas paralelas (para dar uma aparência de reconciliação da eleição incondicional, do microdeterminismo e do amor salvífico de Deus por todos com a liberdade do homem), duas ofertas do evangelho (oferta honesta que não é uma oferta real em oposição à boa oferta do evangelho da Bíblia), o compatibilismo (mas regularmente fala de forma libertária),3 mistério (glosa de contradições geradas calvinísticamente), e usando a distinção entre o intelecto do homem e os aspectos morais para ofuscar a situação dos não-eleitos (ou seja, a pessoa não pode escolher crer).4 No Calvinismo, a Escritura não é simples com profundidade, mas enigmática, sendo estes conceitos acessíveis apenas aos sofisticados teológicos do Calvinismo.

Por exemplo, nas Escrituras, vemos Jesus fazendo ofertas honestas para que se arrependam e sejam salvos (Mt 4:17; 11:20-21; Lc 5:32; 15:7; 24:47). Alguns calvinistas dizem que Jesus estava fazendo uma “oferta honesta” (se é que existe tal ideia), uma vez que, como homem, ele não sabia quem eram os eleitos. Há um problema intransponível em impor a Cristo o desconhecimento de quem são os não-eleitos para sustentar a ideia de que, em vez de apresentar uma boa genuína, ele apenas apresentou uma “oferta honesta”.

Porque Jesus disse que sempre fez a vontade do Pai (Jo 4:34; 5:30; 6:38; 17:4) e não falou por iniciativa própria, mas o que o Pai queria que ele falasse (Jo 3:11, 34; 5:19; 7:16; 8:26, 28, 38; 12:49-50; 14:10, 24, 31; 17:8). Além disso, o Espírito Santo estava sobre Jesus e o encheu sem medida (Is 61:1; Mt 12:18; Lc 3:22; 4:1,14; Jo 3:34; At 10:38). Consequentemente, mesmo que Jesus não soubesse, o Pai e o Espírito Santo sabiam; portanto, a doutrina calvinista da regeneração seletiva torna a Trindade cúmplice nesta deturpação inescrupulosa. A verdade óbvia é que Jesus ordenou-lhes que se arrependessem porque ele não estava disposto que ninguém perecesse e desejou que todos chegassem ao arrependimento (2Pe 3:9), algo que Deus permitiu que todos quantos ouvem a verdade fossem capazes de fazer.

O calvinista Kevin DeYoung questiona: “Deus é sábio o suficiente para fazer a si mesmo conhecido? Ele é bom o suficiente para fazer a si mesmo acessível? Ele é gentil o suficiente para se comunicar de maneira compreensível para os mansos e humildes? Ou Deus nos dá ordens que não podemos compreender e uma autorrevelação que revela mais perguntas do que respostas?”5 Minha resposta é sim; ele é suficientemente sábio, suficientemente bom e suficientemente gracioso, mas não creio que os calvinistas possam consistentemente dizer sim no mesmo sentido, porque o calvinismo atribui a Deus a retenção, para a maioria, daquilo que é necessário para conhecê-lo e torná-lo acessível. E se o calvinismo for verdadeiro, Deus certamente não se comunicou de maneiras compreensíveis aos mansos, humildes ou aos hoi polloi, mas apenas aos sofisticados teólogos iluminados.

A verdade é que, uma vez que Deus fez das Escrituras exotéricas (para serem compreendidas pela pessoa comum), o Calvinismo torna as Escrituras esotéricas (verdadeiramente compreendidas por poucos escolhidos). E apesar do fato de que os calvinistas ainda proclamam a perspicuidade (clareza) das Escrituras.6

Disponível em: <https://soteriology101.com/2022/01/31/calvinism-obscures-the-simple-gospel/>

Traduzido em português por Ícaro Alencar de Oliveira. Rio Branco, Acre, Brasil – 08 de março de 2024.

  1. Por exemplo, o calvinista Kevin DeYoung afirma: “A mensagem salvadora de Jesus Cristo é claramente ensinada nas Escrituras e pode ser compreendida por todos os que têm ouvidos para ouvi-la. Não precisamos de um magistério oficial para nos dizer qual o significado da Bíblia.” Em sua obra Taking God at His Word [Considerando Deus em sua Palavra] (Wheaton: Crossway, 2014), 45. ↩︎
  2. Ver meu livro Does God Love All or Some? [Deus ama a Todos ou a alguns?] especialmente os capítulos 20, 21 e 25. ↩︎
  3. Compatibilismo: Determinismo e responsabilidade moral são compatíveis; daí o nome. Esta compatibilidade não é alcançada porque o compatibilismo é menos determinista do que o determinismo rígido. Pelo contrário, ela é alcançada pela definição da livre-escolha no sentido de que, se uma pessoa escolhe de acordo com o seu maior desejo, ela fez uma escolha livre pela qual é moralmente responsável; mesmo tendo o mesmo passado, ela não é capaz de escolher diferentemente no momento moral da decisão.
     
    Consequentemente, a diferença entre o compatibilismo (determinismo suave) e o determinismo rígido não se encontra nos níveis da natureza determinista de cada um, uma vez que são iguais. Em vez disso, a diferença é que o compatibilismo simplesmente afirma que as pessoas são moralmente responsáveis pelas suas escolhas se estas forem feitas de acordo com o seu maior desejo, e o determinismo rígido diz que não o são. Portanto, a responsabilidade moral é o produto da definição da livre-escolha como uma pessoa que age de acordo com o seu maior desejo, mesmo que o desejo seja determinado.
     
    Libertarianismo: O homem não está determinado. Ele tem a capacidade real de escolher entre opções acessíveis, pelo menos em alguns cenários. Os libertários afirmam que o determinismo não é compatível com a responsabilidade moral. O homem possui uma escolha real de maneira diferente e pode, portanto, agir ou abster-se no momento moral da decisão, dado o mesmo passado dentro de uma determinada gama de opções.
     
    Extensivismo: argumenta que Deus dotou o homem com essa habilidade, que é um aspecto de ser criado à imagem de Deus. Deus determina o leque de opções. O leque de opções de Adão, resultado da graça criativa, era maior do que as opções da humanidade após a queda. O homem caído ainda pode escolher entre opções, mas o leque de opções é menor do que o homem tinha antes da queda. Esta diminuição inclui perder a capacidade de fazer escolhas que são inerentemente justas ou espiritualmente restauradoras (tornar alguém justo diante de Deus) com base unicamente na graça criativa. Para fazer uma escolha inerentemente justa ou espiritualmente restauradora, Deus teve que providenciar a graça redentora – capacitações da graça – o que ele de fato fez. ↩︎
  4. Acrescente a isto as definições exclusivamente específicas do Calvinismo, tais como a soberania enquanto sendo causal e apenas exercível sobre seres determinados ou compativelmente livres, ou os adjetivos necessários na TULIP. ↩︎
  5. Kevin DeYoung, Taking God at His Word [Considerando Deus em sua Palavra] (Wheaton: Crossway, 2014), 69. ↩︎
  6. DeYoung comenta: “A doutrina da clareza das Escrituras não é uma afirmação bruta de que o significado de cada versículo da Bíblia será evidentemente óbvio para todos. Pelo contrário, a clareza das Escrituras sustenta a noção de que pessoas comuns, usando meios comuns, podem compreender com precisão suficiente aquilo que deve ser conhecido, crido e observado para que sejam cristãos fiéis.” Kevin DeYoung, Taking Goda t His Word [Considerando Deus em Sua Palavra] (Wheaton: Crossway, 2014), 59. Acredito que o sistema calvinista também falha aqui. ↩︎

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